Hoje procurei entre meus textos, um que foi adequado à data que se comemora hoje: o dia das mães. O que mais fala sobre a dona Vilanir eu já publiquei aqui no Balaio, "No caldeirão da Vila". Mas aí, pensando bem, em muitos deles ela está presente, como nesse aqui. Aliás, sempre que eu falar de minha experiência de gente pequena, estarei falando dela e de meu pai. E dos meus irmãos também. Assim, dedico esse texto à dona Vila, minha amada mãe, como uma homenagem a todas vocês mulheres, que de algum modo, se reconhecem como mães. Esse texto ainda não decidiu se quer ser uma crônica ou um relato. Como no Balaio não temos etiquetinhas de relato, ele vai como mais uma Crônica de Balaio. Boa leitura!
Em outubro do ano passado, os Jogos Cimarianos completaram
40 anos. Quarenta anos! De 71 a 2011 essas competições vêm fazendo história na
Unidade Educacional Coração Imaculado de Maria. Para os íntimos ou ex-alunos:
UNECIM. Daí o adjetivo Cimarianos. Comecei a estudar na UNECIM em 78, no Jardim
II, e com essa turma fui até a oitava série do primeiro grau. Juntos,
aprendemos a ler e escrever, a falar e nos expressar, a pensar, a pintar e
jogar bolas: de ping-pong, futebol, voleibol, hand. Envelhecemos juntos a maior
parte das nossas infâncias. Crescemos ali, palmo a palmo. Um na carteira da
frente, outro na carteira do lado. Ora prestando atenção nas aulas, ora
prestando atenção nas meninas, ora nos meninos, tão feinhos ano passado, mas
esse ano tão lindos! Crescemos. Pelos, peitos, pernas, pomos. Adões e Evas. E
de ano em ano exibíamos nossas aptidões ou inaptidões nos Jogos Cimarianos.
Houve um ano em que eu competi pela minha turma em tudo que era possível:
futebol, basquete, vôlei, até salto em altura! Naquele ano, eu até ganhei uma
medalha de goleira revelação. Foi no hand. Eu estava tão bem que meu professor
de Educação Física veio conversar comigo no meio jogo para elogiar meu
desempenho. Bem nessa hora o time adversário fez um gol. Também, pudera, não é?
Mas os
Jogos Cimarianos não trazem lembranças só das competições. O que mais salta à
memória era os uniformes. Todo ano era um calçãozinho King, uma camiseta Hering
e o velho e bom Kichute, que nos acompanhava o ano inteiro. Cada turma com o
calção da sua cor. Aí à medida que crescíamos passávamos por todas as cores.
Verde, amarelo, azul, vermelho, vinho, preto. Era bonito ver, no desfile de
abertura dos jogos, aquela ruma de menino, tudo organizadinho por cores. E mais,
tinha a eleição da Rainha dos Jogos. Era sim. Cada turma elegia, por voto
direto e secreto, sua rainha, que desfilava na frente dos súditos com a
bandeira da sala, no dia da abertura. A Rainha era sempre a menina mais bonita.
Na minha turma, era a Mara. Vários anos durou o seu reinado, até que na
terceira série, no ano do vinho, digo melhor, da cor vinho nos calções King, eu
fui eleita a Rainha dos jogos. Parece que estou vendo a Norma, na época tia
Norma, lendo o resultado das eleições e computando os votos na lousa. Deu para
sentir uma pontinha de satisfação no seu rosto com o resultado. “Ei, espera lá!
Agora me acorreu uma tragédia! E se a Norma tiver manipulado o resultado das
eleições só pra me favorecer? Ela jamais faria isso! E se ela tiver feito? E se
ela tiver achado que era bom dar o título a outra menina, ainda que injusto com
a Mara? Mas, será? Não quero nem descobrir.”
Crises à
parte, o mais legal era que Rainha, não desfilava de calção, não. Era de saia.
Uma sainha envelope, de tergal na cor dos calções dos súditos, e viés branco.
Minha mãe que fez. Ah, também tinha a faixa e a simpatia de Rainha. Acho que
nunca, em momento algum da história dos Jogos Ciamarianos, houve uma Rainha tão
séria quanto eu. Olhando as fotos daquele dia parecia que eu estava carregando
uma cruz e não uma faixa de rainha. Devo ter sentido muita vergonha. Sim,
porque eu realmente queria que me achassem mais bonita que a Mara, pelo menos
uma vez na vida, mas daí a ter que desfilar, eram outros quinhentos. Perdi a única chance até hoje de dar uma
ordem real: Mara Denise, desfile com a faixa de Rainha do Terceiro Ano. Que
saudade... saudade dos jogos, do colégio, dos colegas. Esses eram umas figuras.
Houve
uma série em que na lista de chamada estavam presentes não menos que: Anna
Karenina, Cláudio César, Leila Diniz e Márcia de Windsor. Que turma! E os pais
também davam sua contribuição direta ao tema excentricidade. O meio de
transporte preferido eram as bicicletas. Quem não ia e voltava de bicicleta era
levado e buscado na garupa de uma. Na entrada ou na saída era aquela exposição.
E a mais excepcional de todas era a do pai do Cláudio César. Era uma Monark
comum, não fosse o guidão ter sido substituído por uma direção branca de Kombi.
Dá para imaginar? Também dá para imaginar que todos nós morríamos de vontade de
andar naquela bicicleta, não é?
Enquanto
o pai não chegava, a figura magrinha do Cláudio ficava esperando ali, pertinho
da Marlene, nossa bedel. Era ela que conferia as meias brancas, os sapatos
pretos, a limpeza das fardas. Era aquele ser humano pequeno na estatura e
enorme no cuidado com a gente, que abria e fechava o portão todos os dias de
aula. Às vezes brava e severa, mas um amor com quem não precisava desafiá-la.
Outra figura icônica da UNECIM daqueles tempos era a Geralda. Sisuda e
longilínea, ela caminhava pelos corredores da escola resolvendo as pendengas da
secretaria. Cabelo fino e liso, se bem me lembro à altura do ombro, e saia
abaixo do joelho. Seria o trabalho dela muito duro? Muito chato? Seria sua vida
difícil? Acho que a gente tinha medo dela.
E os
professores? Bom, esses merecem uma crônica cada um. No começo eram só
professoras e uma única para o ano inteiro. A partir da quinta série,
passávamos a ter vários, um para cada matéria. Lembro-me de que passar da
quarta para a quinta série foi um rito dolorido. Não só porque eu não queria
ter muitos professores, mas também porque eu adorava estudar de manhã. Não
houve escolha, mas logo me adaptei. Adorei ter aulas de ciências com a tia
Jura. É, naquela época, podíamos chamar de tia. Era divertido ouvi-la
argumentar, cientificamente, que não era nada vantajoso tapar o nariz e
respirar pela boca, quando o Paulo soltava um pum. O nariz era que tinha sido
feito para os cheiros. Bons ou ruins. Também adorei as aulas de português com a
irmã Margareth e a irmã da Graça.
Análise sintática, morfológica, interpretação de texto, redação. Ah,
tinha o Gideon em Geografia. Ele valorizava tudo que nós sabíamos. Não tenho dúvida
de que sou feita do que eles me ensinaram. Talvez mais do uma disciplina, eles
me ensinaram o amor pelo entender, pelo saber, pela curiosidade, pelo
conhecimento em si. Espero estar fazendo assim com meus alunos.
De
uns anos para cá tenho recebido notícias de algumas dessas figuras. Assim como
os Jogos Cimarianos, estamos todos bem perto dos 40. Alguns já devem ter feito,
outros como eu, completam esse ano; alguns ainda ano que vem. Mas todos muito
próximos e ao mesmo tempo tão distantes. O que será que foram essas vidas até
aqui? Às vezes sinto uma curiosidade enorme para saber o que a vida fez com
cada um, ou melhor, o que cada um fez com a vida que lhe foi dada. Uns casados,
outros só amando. Uns felizes, outros tentando. Uns com filhos, outros com os
pais. Enfim, muitas vidas ao longo desses 40 anos dos Jogos Cimarianos! Mas
será que a Norma manipulou mesmo o resultado? Eu não vou suportar.
Kare, você e seus eternos dilemas!!! "E se a Norma tiver manipulado o resultado das eleições só pra me favorecer? Ela jamais faria isso! E se ela tiver feito?" Se convença, mulher, de que você foi feita de um material especial e de que a forma foi jogada fora!!! Você é ma-ra-vi-lho-sa!!! Como pessoa, escritora, amiga, enfim: tudo! Show de bola esse texto! Adorei os detalhes com que descreveu tudo - dá pra ver as cenas mesmo sem ter a mínima idéia de onde é que fica o UNECIM! kkkkkkkkkkkkkk
ResponderExcluirHa ha ha ha... Fazinha, sem dilema não sou eu!! Que bom que você gostou do texto. Já tava sentindo falta das suas visitas comentativas. Beijo com saudade.
ExcluirPrimeiro, fui ler O Encontro. Temos o Audifax em comum, só que o conheço de longa data (lá pelos 1960)...Vi seu comentário lá na Oficina do Audifax, na virtual, cliquei e cheguei naquela formidável crônica. Já me instalei, aí na sua galeria de seguidores, e vou voltar, Kare.
ResponderExcluirFeliz de quem encontra este doce homem, e sua família,pela estrada na vida...
Um abraço,
da Lúcia
Querida Lúcia, muito obrigada pela sua visita e seu comentário. Você tem toda razão quanto ao Encontro que se vive quando se encontra o Audifax. Volte mesmo! Um abraço.
ExcluirPaz e bem!
ResponderExcluirAnna, conversando com o Cláudio César (hoje trabalhamos no mesmo local), sobre a histórica votação que a tornou rainha da turma, descobrimos o nosso voto um para o outro e, não teve jeito, votamos em você.
E fomos muito bem representados, com ou sem sorrisos!
Um abraço no coração!
Ricardo Eugênio
Russas -CE
Meus amores, que saudade!! Saber disso me deixa um pouco aliviada da minha dúvida, he he he he. Posso aperriar, vocês? Por que vocês organizam um encontro nosso aí em Russas, heim? Você tem contato com a Norma, tem notícias dela?
ResponderExcluirmilhões de beijos e abraços,
Anna