Pois é...
finalmente, o 2015 chegou também ao Balaio!! Desejando que o seu 2015 continue
iluminando e abrindo um novo t api'i'rapé a cada dia. Boa leitura!
Faz tanto
tempo eu li, em um dos textos do Rubem Alves, não me lembro exatamente em qual,
que o único mecanismo de defesa da anta era correr para o seu velho e bom
caminho. A proteção viria pelo fato de que em um dado trecho a passagem era
apertada o suficiente para passar apenas a anta, deixando para trás o eventual
predador que estivesse com as garras e presas encravadas em sua carne.
Particularmente, do alto da minha sapiência de sapiens sapiens, eu não diria
que esta é uma boa estratégia de sobrevivência. Mas considerando o fato de que
essa espécie só está ameaçada de extinção por causa da caça pelos sapiens e do
desmatamento, talvez a estratégia não seja, assim, de todo ruim.
Pois foi
depois que me mudei, recentemente, que essa história voltou às lembranças.
Dentro da casa nova senti exatamente o que deve sentir uma anta em
reabilitação, que é deixada numa floresta estranha. Não havia caminhos
conhecidos que me fizessem sentir familiaridade ou proteção. Voltar para aquela
floresta, ao final do dia, implicava sempre negociações. A casa não me acolhia.
Não tinha jeito. Na verdade, o espaço novo oferecia uma resistência danada à
minha entrada. Eu desejava um caminhozinho que fosse. Mas não apareceu nenhuma
anta salvadora para me ajudar. Isso só começou a mudar quando passei a receber
na minha nova floresta as pessoas mais queridas: as escritoras das tardes
alegres de terça-feira, as bruxas amáveis dos diálogos com as deusas, as
Azevedas, os Martins a Eva. Elas foram amansando o espaço e ele, aos
pouquinhos, cedia. Passava a ser familiar, se mostrava familiar. Quase sorria
pra mim.
O mais
engraçado, foi perceber que quando o espaço me acolheu eu fui lá e mexi nele de
novo! Mudei uma mesa de lugar, reorganizei um dos quartos, mexi nas plantas,
inutilizei armadores, planejei novos, pendurei outros quadros. Só que dessa
vez, ele me aguentou. Nem reclamou nem nada. Parece que agora somos já
parceiros. Ou como diz a Bel, meu anjo da guarda, finalmente, chegou. É como se
todos os caminhos ali dentro já fossem meus, conhecidos ou não, trilhados ou
não. Todos caminhos da Anna. Aliás, os índios Aikewára conhecem ainda outro
caminho da anta, Tapi'i'rapé. No céu deles, há uma constelação, Anta do Norte,
que surge ao anoitecer na segunda quinzena de setembro, no lado Leste e caminha
pela Via Láctea. Para eles a Via Láctea é o caminho da anta, Tapi'i'rapé. E que
caminho! Essa constelação indica uma estação de transição entre o frio e o
calor para os índios do sul do Brasil e entre a seca e a chuva para os índios
do norte do Brasil.
Um caminho
da anta que não representa nem só o familiar, nem só a mesmice, e sim o
movimento, a transição, a mudança. Talvez seja isso que faça a presença das
pessoas amadas no novo espaço. Seus passos, seus corpos se deslocam fazendo o
ar dançar, fazendo o espaço bailar numa dança de vida. Aí as pegadas ficam como
pontos reluzentes e o chão vira um céu onde brilha um Tapi'i'rapé só meu, só
nosso. Não leio mais Rubem Alves. Ele ficou um pouco repetitivo pra mim. Mas
talvez todo autor fique repetitivo quando se dedica a defender uma ideia, uma
hipótese. Talvez, até os grandes autores tenham o seu caminho da anta.
Ate ler sua cronica eu não sabia mas certamente sempre tive também isso...um caminho, um refugio, um porto seguro...o caminho da anta. Adorei Kare.
ResponderExcluirAhhh Bel querida! Você sempre deixando o perfume dos comentários, quando passa por aqui, né? Obrigada!!
ResponderExcluirbeijo,
da Anna.